O café passa por diversas etapas até chegar na xícara e uma delas é o cupping ou prova de xícara. Depois que ele sai da fazenda e está pronto para ser comercializado, o café deve ser classificado sensorialmente para avaliar a qualidade da bebida, dessa maneira é possível certificar a sua qualidade. Nos cafés especiais, essa classificação é feita usando o protocolo de avaliação da SCA (Associação de Cafés Especiais). É possível fazer o cupping em casa para ter uma ideia de como todo o processo funciona, é super legal!

Assista ao vídeo de como fazer cupping em casa ou continue lendo.

Premissas para o Cupping

A SCA é uma associação internacional que dá as diretrizes para classificar o café especial. Ela criou um protocolo de avaliação para que profissionais licenciados pudessem dar notas aos cafés, de forma a categorizá-los e certificar a sua qualidade.

Neste protocolo, a SCA estipula desde o ponto de torra, a moagem do café, a qualidade da água até o recipiente que deve ser usado. 

Para a classificação técnica, a torra do café deve ser completada de 8 a 12 minutos e deve ser feita 24h antes da prova. O café deve ter pelo menos 8h de descanso depois de torrado.

Deve-se usar no cupping um recipiente de vidro temperado ou cerâmica, que tenha 150ml a 225 ml de capacidade máxima e deve-se usar 8,25g de pó de café para 150ml de água.

A prova técnica é realizada utilizando 5 amostras (5 xícaras) de cada café específico. Elas são alinhadas formando um “M” e sempre comece a prova debaixo para cima, da esquerda para a direita.

(Como aqui estamos fazendo uma prova em casa, usamos 3 xícaras, que já são suficientes para provar o café).

Formulário de Avaliação Sensorial

O formulário da SCA possui os campos de cada atributo que será avaliado, quais sejam: fragrância e aroma, sabor, finalização, acidez, corpo, uniformidade, equilíbrio, xícara limpa, doçura e visão geral.

Em cada atributo devemos preencher com uma nota de 6 a 10 em cada um dos atributos avaliados de acordo com a escala de qualidade. 

O resultado da soma de todos os atributos é a nota final do café.

Como se trata de um protocolo para cafés especiais, usa-se apenas para cafés que suspeita-se ou tem certeza de que será da categoria especial.

Aqui tem o formulário que você pode baixar para usar para fazer o cupping em casa.

Com o formulário em mãos, é hora de avaliar.

Passo 1 – Avaliação da Fragrância e Aroma (“Fragrance/Aroma”)

A moagem do café deve ser feita imediatamente antes de provar (não pode passar mais de 15 minutos) e deve ser levemente mais grossa que a moagem para o filtro – ou seja, grossa como farinha para quibe.

Para garantir a segurança da amostra, deve-se limpar o moedor entre as moagens e, logo depois de moer, tem que colocar uma tampa para preservar o aroma.

Dentro de 15 minutos após as amostras terem sido moídas, a fragrância seca das amostras deve ser avaliada, cheirando ao pó seco. Na primeira coluna vertical do protocolo, tem uma escala “dry” para colocar a intensidade da fragrância (do pó seco). 

Logo embaixo no campo “notas” (“Notes”), já podemos preencher com as notas sensoriais que aquele café remeteu. 

ATENÇÃO: A identificação das notas não precisa necessariamente ser específica. Por exemplo, se o café lhe trouxe a lembrança de um doce, mas que você não consegue identificar qual, escreva simplesmente “doce” nas notas. 

Com o tempo e na medida em que a amostra é avaliada, refinamos as percepções até chegar na nota específica que aquele café remete. Para quem está começando a provar cafés, identificar se o café é frutado, doce, chocolate, castanhas ou exótico, já está excelente. 

Aqui já tem um post ensinando a sentir as notas sensoriais dos cafés. E você pode baixar a Roda de Sabores do Provador de Café em alta resolução aqui.

Após a avaliação da fragrância, é hora de hidratar o café. Não espere mais que meia hora depois que o café foi moído para iniciar este processo. A água utilizada deve ser limpa, sem cheiro e odor. E deverá ter por volta de 93 graus celsius quando colocada no café. 

Na hora de colocar a água, coloque até a borda da xícara, certificando que está molhando todo o pó e de uma só vez, sem fazer pausas.

Depois de hidratada, a amostra tem que ficar sem interrupções por 3 a 5 minutos. Tome cuidado para não bater na mesa, para deixar a crosta intacta.

Com 4 minutos após ter colocado a água, é hora de quebrar a crosta. Faça isso agitando três vezes suavemente, permitindo que a espuma escorra nas costas da colher enquanto cheira suavemente o aroma. Anote na coluna vertical da “quebra” (“break”) no protocolo.

A nota deverá ser dada de acordo com a intensidade e agradabilidade dele. Se foi muito agradável e complexo, a nota será mais alta. Se está fraco e pouco complexo, será mais baixa.

Com base no equilíbrio da avaliação da amostra seca e úmida, marque a coluna horizontal e dê a nota final do atributo de fragrância e aroma.

Antes de passar para o próximo atributo, é hora de limpar a xícara e prepará-la para provar. Com a ajuda de 2 colheres, limpe a superfície da xícara com cuidado, removendo as espumas e eventuais partes de café que ficam flutuando por cima. Tome cuidado para apenas passar a colher pela superfície e não misturar o pó que está decantado no fundo da xícara.

Descarte as espumas e lembre sempre de limpar as colheres com água quente entre uma amostra e outra, tanto na hora de limpar, quanto na hora de provar, entre uma xícara e outra.

Passo 2 – Sabor, Finalização (retrogosto), Acidez, Corpo e Equilíbrio

A avaliação desses atributos deverá começar quando a amostra esfriar até chegar a uma temperatura por volta de 71º C, que acontece em cerca de 8-10 minutos após a infusão do item anterior.

Usando preferencialmente uma colher de cupping, que é uma pequena concha, pegue uma dose de café suficiente para sentir o gosto. Aspire bem forte o líquido na boca de forma a cobrir a maior área possível, especialmente a língua e o palato superior.

Você pode engolir a amostra ou descartar, cuspindo em um copo grande ou recipiente. (Normalmente os provadores profissionais descartam as amostras, pois na rotina desses profissionais é muito comum avaliar várias amostras em um mesmo dia – pensa na quantidade de cafeína depois de avaliar 50 xícaras? risos)

Preencha a coluna do Sabor (“Flavor”) e, da mesma forma que no passo 1, anote nas “Notas” os sabores que sentir na amostra. 

Em seguida, preencha a Finalização (“Aftertaste”), de acordo com a sensação persistente do café na boca após a ingestão da bebida. Quanto mais longa e agradável, maior será a nota.

À medida que o café vai esfriando (entre 70º C a 60º C), é a hora de avaliar os outros 3 atributos.

A Acidez (“Acidity”) é avaliada de acordo com a intensidade dela. Use a coluna vertical para orientar a intensidade e, em seguida, após uma segunda prova, confirme a agradabilidade com a intensidade e marque na coluna horizontal. Caso perceba a presença de algum tipo de acidez diferente (como a málica ou fosfórica), anote no campo de notas. 

O Corpo (“Body”) é a sensação tátil de viscosidade, oleosidade ou densidade, percebida na cavidade bucal. Quanto mais pesado for, maior será a nota. Use a coluna vertical para orientar a intensidade e, em seguida, após uma segunda prova, confirme o peso do líquido e marque na coluna horizontal. 

O equilíbrio (“Balance”) é a avaliação da combinação do Sabor, Finalização, Acidez e Corpo, ou seja, de quão bem todos esses atributos se encaixam em uma combinação sinérgica. Em outras palavras, quanto maior os atributos estiverem em harmonia entre si, maior será a nota.

Se você quer saber mais especificamente sobre o que são esses atributos sensoriais (Acidez, corpo, etc), já fizemos um conteúdo específico sobre isso que você encontra aqui.

Passo 3 – Doçura, uniformidade e limpeza da xícara

À medida que as amostras vão se aproximando da temperatura ambiente (cerca de 38º C), é o momento de avaliar a Doçura (“Sweetness”), Uniformidade (“Uniformity”) e Xícara limpa (“Clean Cup”).

Para esses atributos, damos uma avaliação de 2 pontos para cada xícara, considerando que estamos avaliando 5 xícaras, com uma pontuação máxima de 10 pontos em cada atributo.

Na Doçura, é avaliada apenas a presença ou não dela. Aqui não medimos a intensidade da presença de doçura. Lembrando que se refere ao sabor doce agradável da bebida, que é muito sutil, sendo seu oposto o sabor amargo. 

A Uniformidade está relacionada à constância de todas as amostras, se alguma delas estiver diferente entre as outras, é penalizado em 2 pontos por xícara.

A avaliação da Xícara limpa está relacionada à transparência da bebida. A nota será máxima se não houver interferência de impressões negativas no sabor das amostras, desde o início da prova até o final.

Passo 4 – Pontuação Geral e Defeitos

A avaliação do café deve acabar quando a amostra atingir 21º C. 

A Pontuação Geral (“Overall”) é o conjunto de TODOS os atributos combinados. Ou seja, dos aromas da bebida e de seu grau de intensidade, do equilíbrio e da harmonia da bebida. Este é o único momento em que o provador poderá fazer uma avaliação pessoal e não técnica.

Os defeitos serão penalizados subtraindo 2 pontos por defeito leve e 4 por defeito grave de bebida.

Passo 5 – Pontuação Total

Depois de avaliar as amostras, todas as pontuações são somadas conforme descrito na seção “Pontuação” e a pontuação final é escrita na caixa da direita, subtraindo os defeitos, se houver.

Prontinho!

Parece complexo, mas para quem quer entender mais sobre cafés, é um exercício super gostoso. Além de conhecer mais sobre, é importante para o consumidor conseguir identificar melhor se realmente aquele café que foi adquirido como especial se encaixa nessa categoria.

Para fazer essa avaliação do vídeo, nós usamos o café Doce Tango, e a avaliação completa dele está aqui:

Lembrando: essas são dicas para replicar em casa, para auxiliar consumidores de café que gostariam de conhecer mais sobre os processos técnicos para avaliar nossa bebida favorita. Caso esteja procurando fazer a avaliação sensorial técnica de um café para fins comerciais ou acadêmicos, recomendo procurar diretamente a BSCA (Associação Brasileira de Cafés Especiais) para mais informações.

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